As 82 famílias que moram na comunidade Boca da Mata, em Arcos, na região Centro-Oeste do estado, estão assustadas com a divulgação de um estudo feito pela Feam (Fundação Estadual de Meio Ambiente). A análise encontrou níveis altos de metais pesados na água e no solo da região e constatou que o problema está ligado ao funcionamento de uma fábrica de cimentos que pertence à CSN (Companhia Siderúrgica Nacional).
Segundo os moradores, em 2009 a água coletada nos poços artesianos da comunidade começou a apresentar cor e odor estranho. Foi quando o caso foi levado à Feam. “A água estava com cheiro de ferrugem e começou a ficar escura. Foi aí que a gente percebeu que tinha algo estranho”, conta o produtor rural Vilmar Junior, que vive no Sítio Alegria, ao lado da fábrica da CSN.
A partir da denúncia dos moradores, a Feam deu início à investigação. Foram coletadas amostras de água e de solo em pelo menos 21 pontos da propriedade que pertence ao Vilmar. O parecer técnico do relatório da Investigação Ambiental Detalhada para Avaliação de Risco à Saúde Humana e Plano de Intervenção levou mais de 10 anos para ficar pronto e constatou que houve contaminação de uma grande área ao lado da indústria.
Nas amostras da água subterrânea, a Feam encontrou ferro, manganês, cobalto e níquel. Já no solo foram constatadas concentrações elevadas de arsênio e cromo. No estudo, a Feam afirma ainda que “entendemos que existe um nexo causal entre os resultados verificados no Sítio Alegria e a operação da CSN”. Uma das suspeitas é que a contaminação do solo e do lençol freático tenha sido causada por vazamentos de uma barragem de rejeitos de calcário, que pertence à CSN e fica bem ao lado da propriedade.
“A gente ficou extremamente assustado e preocupado. Porque a gente consumiu essa água por muito tempo, sem saber que já poderia estar contaminada”, comenta Edilse Rodrigues, moradora do sítio Alegria.
Após a divulgação do laudo, a Feam delimitou uma área de restrição de uso de água e recomendou que os moradores do Sítio Alegria desativassem os poços artesianos. A propriedade, com 16 hectares, pertence à família há mais de 70 anos e era usada para plantio de milho e produção de cachaça e melaço, em um alambique.
“Tivemos que interromper os investimentos e a produção agrícola ficou inviável. Sem poder usar a água, não temos como trabalhar”, completa Edilse. Um acordo foi firmado com a CSN, que se comprometeu a fornecer caminhões-pipa com água para o consumo da família, mas segundo os moradores a qualidade da água não é boa. “Pra piorar, o caminhão que usam para transportar a água que trazem pra gente não é o adequado. A água é suja, muitas vezes não dá nem pra usar”, conta Edilse.
No sítio, a família também possuiu um alambique. Foram investidos mais de R$ 2 milhões para equipar e adequar a fábrica, que produzia 350 litros de cachaça por dia. A empresa se preparava para o início das exportações, mas teve que demitir todos os funcionários e interromper a produção. “Quando o laudo comprovou que a água estava contaminada, não tivemos condições de trabalhar. A gente perdeu o ânimo, não tem o que fazer. Nosso plano é retomar com as atividades, mas ainda não sabemos como”, lamenta Vilmar.
O Sítio Alegria fica bem ao lado do Rio Candonga e a família teme que ele também tenha sido contaminado por metais pesados, apesar da análise da Feam não ter apontado essa hipótese. “A gente se sente abandonado. Até hoje, a CSN não deu uma explicação concreta do que pretende fazer pra solucionar definitivamente o problema”, diz Edilse.
As famílias que vivem na comunidade temem que os danos ambientais causados pela contaminação do solo e da água se tornem ainda maiores, caso nenhuma providência seja tomada.
Em nota, a CSN diz que “cumpre rigorosamente todas as normas técnicas aplicáveis e recomendações do órgão ambiental (Feam)”. A empresa destacou que, em outubro do ano passado, firmou um Termo de Compromisso com os proprietários da área, garantindo o fornecimento de caminhões-pipa com água mineral para o consumo humano até que um novo poço seja perfurado. A Companhia alega ainda que “todos os estudos ambientais realizados até o momento, por empresas de consultoria e laboratórios especializados e independentes, não apontaram qualquer relação entre as concentrações de ferro verificadas no poço existente na propriedade do Sítio Alegria e as atividades operacionais da CSN ou do depósito de rejeitos de calcário”.
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